Agora todos sabemos da
fragilidade dos sistemas de proteção social e que daqui a uns anos a sua
falência está prevista.
Agora todos sabemos que é
necessário precavermo-nos dessa situação futura e os regimes privados de
proteção social deverão ser rapidamente promovidos.
Se eu tivesse sabido há 30 anos,
quando comecei a trabalhar e a descontar para a reforma, que esta não seria por
inteiro, como a dos meus pais e do meu irmão mais velho felizmente foram, ter-me-ia
precavido com um plano de pensão privado. Sendo funcionária pública esse plano
de pensão privado seria mais um encargo/redução salarial a acrescentar aos que
já sofri, pois o estado obriga-me mensalmente a descontar para a reforma dos
outros. A solidariedade é provavelmente o valor que mais prezo e ao longo da
minha vida de trabalho senti, sinto e sentirei que devo contribuir para o
bem-estar de todos aqueles que trabalharam e que me proporcionaram a qualidade
de vida de que agora usufruo (usufruía). De igual modo esperaria que no futuro
outros o fizessem por mim e por todos aqueles que estão agora no ativo. Engano!
Com a crise há menos nascimentos, com a crise há mais desemprego, e daqui a
duas dezenas de anos haverá menos gente no ativo e a minha reforma reduzida em 40%
não me permitirá pagar a alimentação quanto mais os medicamentos.
E a perversidade de tudo isto! Culpar
unicamente o aumento da esperança de vida da crise da segurança social que
agora se faz sentir. Foi a melhoria dos cuidados médicos, dos cuidados
alimentares e das condições higieno-sanitárias, que muito contribuíram para o
aumento da esperança de vida e agora com a crise vai-se assistir ao deteriorar
de todas essas condições e provavelmente ao aumento da mortalidade média da
população.
Não sei qual foi a razão primeira
e os fatores considerados quando se estabeleceu uma idade para a reforma nos
países com regimes de proteção social. É um facto que nas profissões de
desgaste rápido a idade de reforma é antecipada em relação à das outras
profissões. Não é o caso da minha profissão.
A relação entre duração da
atividade laboral e o tempo de atribuição da pensão é do tipo olho por olho dente por dente mas parece-me
ser o critério mais justo.
Por acaso gosto do que faço e não
sou daquelas pessoas que “está morta” por ver chegar a reforma para fazer o que
gosta. Estou, no entanto, consciente de que as minhas capacidades intelectuais
e resistência física têm vindo a diminuir e ainda só tenho 53 anos. Não sei se
há uma relação diretamente proporcional entre a esperança da vida e as
capacidades intelectuais e/ou físicas, a não ser, claro, na hora da morte.
Sei que quando tratava de
elaborar um artigo tudo ficou mais fácil após uns 20 anos de prática, mas
agora, após 30 anos, a minha capacidade de ir buscar mentalmente reforços a
essa parte do cérebro que lida com os arquivos, está diminuída assim como
diminuída está a minha paciência e disponibilidade para com os alunos quando
comparo com a de há 10 anos atrás.
Também sei que cada vez mais em
custa cortar as sebes ou cavar a mini-horta, o que anteriormente era um
entretenimento e que agora é quase um sacrifício. Se há alguns anos poderia
facilmente contratar alguém para o fazer por mim, agora, com o corte salarial,
isso já não é possível. Não sei como estarei aos 70 anos de idade e se os meus
alunos aprenderão muito comigo. A horta e o jardim, com tantos cortes salariais
mesmo ainda no ativo mais os cortes na reforma, nessa altura, também já deverão
ter morrido!
Não partilho da opinião de que se
colocarem a terceira geração a trabalhar até aos 70 se faça uma melhor
distribuição dos custos entre gerações, conforme diz a OCDE. Evidentemente que
se protegem os trabalhadores mais velhos de políticas de afastamento compulsivo
dos seus empregos, mas claramente não vai aumentar a empregabilidade dos mais
jovens e, tal como outras medidas de contenção de crise, o seu efeito benéfico
é duvidoso. E ainda por cima (Mais perversidade!) essa proposta da OCDE
afetaria duplamente os trabalhadores/pensionistas, que iriam trabalhar mais
anos e ainda por cima sofreriam uma redução dramática do valor da sua pensão em
cerca de 40%.
E por ter tido esta ilusão de que
vivia numa Europa social e desenvolvida e não num qualquer estado liberal do
outro mundo, estou “lixada“ . Quando chegar a minha hora da reforma o meu nível
de vida vai consideravelmente baixar justamente quando se esperaria que não me
preocupasse com a sobrevivência económica, mas sim com a sobrevivência ipsis verbis.
*novo AO