28/08/2012

A influência das telenovelas no falar das gentes

Foi uma semana atribulada na aldeia com uma entorse no pé e com mãe idosa que ocupava o televisor todas as noites depois de jantar para assistir, durante 2 horas e meia mais os intervalos de longa duração, a 3 telenovelas da TVI, com nomes sugestivos: Louco Amor, Doce Tentação e Remédio Santo.
Não vou criticar o conteúdo das telenovelas, mas não posso deixar de realçar algumas curiosidades: em todas elas, embora as cenas decorram na atualidade, vêem-se empregadas internas fardadas a servir à mesa, governantas e
au pairs, à moda dos “bons velhos tempos”. Em todas elas aparecem umas senhoras mais velhas a falar com um sotaque supostamente de “gente fina” e outras pessoas mais novas que falam entredentes sem qualquer movimento das comissuras labiais, supostamente representantes da mesma classe.
Recordo-me, porque achei imensa graça, que o Herman José distinguiu a origem social dos intérpretes do fado da seguinte forma: os do povo abrem bem a boca para cantar e os de origem aristocrática cantam de boca quase fechada.

Nesta onda de mal abrir a boca para falar, que por certo também dificulta a leitura labial das pessoas com surdez, assiste-se ainda ao silenciar da sílaba tónica da 1ª pessoa do plural do pretérito perfeito simples. Não sabemos se os atores da cena se referem ao presente ou ao passado porque pronunciam da mesma maneira a 1ª pessoa do plural do presente do indicativo e a 1ª pessoa do plural do pretérito perfeito simples: Falamos e falámos; ficamos e ficámos; andamos e andámos, etc.
Não percebo o porquê desta mania de falar de forma cada vez mais monocórdica, que não é característica de uma região em particular, como acontece com outros sotaques, e ainda por cima associar este mal falar ao falar da “gente fina”. Espero que “o povo” não a venha a imitar!

Manuela Vaz Velho

*novo AO